segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

No fundo do coração















No fundo do coração humano,
onde dança sedutoramente  
toda sorte de escambos,
existe uma coleção de sapatos
que já foi utilizada em espetáculos.
É onde se guarda o fausto de toda gala.
Há peixes que vêm e vão sem que
o coração saiba exatamente quais permanecerão.
Há rancores alimentados num aquário.
Há pneus desgastados dos lugares visitados
pelo eu em bailes de mascarados.
Entretanto, não há grandes precipícios.
O que se encontra é um mágico enigmático
escondido na rasura dos orifícios,
que sabe plantar um coelho que servirá de esteio
a quem procure abrigo.
O horizonte é um campo branco de cálcio
onde se inscreve a sorte dos delírios performáticos
e é do fundo do coração e não da língua,
que vem a lâmina gasta de selecionar palavras.
Toca o aboio grave para a mais amarga,
considerada joio de ameaças.
Deve ser tangida e urgentemente rejeitada.
Quando chove elogios, os pingos borrifam o deserto.
Vem então um vendaval refrescante
e, no mesmo instante, inflado de felicidade, 
suspira realizado o ego.
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domingo, 28 de dezembro de 2014

Flauta















Toca, vento, a flauta de mamona,
e atiça essa dança
em quem dorme primeiro
na festa de terreiro,
com a cantiga de Luanda.
Caça, vento, cada furo
na bagana de uma chave
nessa cana que invade o escuro
e liberta a ciranda
na sonora melodia sem demora
que preenche o ambiente
com o tônus de uma ária
deste colmo de bambu
e de corpo braquiária.
Bate, vento, cem por cento
bem lá dentro deste caule
e espalha a sonora
que dormia lá no balde
a espera de um momento
que tornasse valiosa
a estrela escondida
no borralho dessa vida
congelada de demora.
Manda, vento, esse canto
onde a bula que atua
lá na rua em prol do esquecimento,
seja sucumbida nesse movimento
e consiga  audiência
numa onda de freqüência
tão precisa que até
quando improvisa
sempre faça encantamento.



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sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Lenda















                           

Na esquadra na qual
vieram muitos de Portugal
eu vim também,
trazendo os meus améns.
Trouxe semente de alvoradas
e confiança no trabalho
de evolução das estradas,
feitas de pó e cascalho.
Vim com essa voz íntima
que na alma muito lembra
uma névoa muito tímida
de verdade feito lenda.
Portugal tinha o desejo
de abrir o Alentejo
no espaço de um domínio,
mas tudo isso era desígnio
de um plano elevado.
Nesta oportunidade
vi na terra abençoada
o lugar da caridade
que a malta esperava,
e na selva dos teus índios
eu arei o meu caminho,
projetando no futuro
uma luz no novo mundo.



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Amor civilizado















No vidro da janela de ferro, esquecemos o ser fraterno.
A solidariedade é gardênia que não necessita
vênia para vagar misturada aos muitos vapores de cidade.
Confunde-se no perfume amadeirado da moça
que desfila leve na via alegre do dia ensolarado
que deve rejeitar pensamentos tristes
da mazela milenar que no mundo existe.
Confunde-se no cheiro de comida e sucos
que sai de cada restaurante,
convidando ao preço de tudo, o lanche.
Confunde-se no expansionismo romano
de uma cartilha de egoísmo na qual nos formamos.
A sua nobreza, no código civilizado, deveria ser natural,
mas causa estranheza e deixa estupefato em maravilhas
aquele que oscila entre o acender e o apagar nas matilhas.
A febre de amar é fraca nos processos endêmicos.
É distante nos impactos acadêmicos
e o seu vírus tropical viaja no vento  a todo canto.
Espalha o seringal dos espantos
nos terrenos barrentos de uma área
que ainda não reconheceu na lição
o pouco que choveu o chão em cada pranto.

Apesar de tudo, a solidariedade sempre haverá de escapar
dos depósitos em ataques migratórios a todos os lugares.
Haverá de esticar os apartamentos do grande centro
aos quintais onde os esquecimentos virtuais
possam edificar-se concretamente.
A sua chamada para abraçar o indigente é sutil
dentro da surdez vil que não escuta apelos,
por estar ocupada em zelos
na conquista de interesses próprios e não alheios.
Todavia, é essa sinfonia quase inaudível
que convida a aproximação da periferia insensível
ao foco de atenção naqueles que estendem a mão
e estão, por assim dizer, embriagados
na miséria que os tornou solitários.
Do outro lado estamos nós, elevados
num voo de albatroz e praticantes, a todo instante,
do olhar dissimulado que não aceita fardos.
Estamos, também, embriagados na cegueira
de vivermos na beira com esse egoísmo
que ainda não aprendeu o civismo
na prática de um amor solidário.








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sábado, 20 de dezembro de 2014

Então é Natal















Porque Ele veio ao mundo em testemunho,
enfatiza-se o verbo nascer, que tem 
o poder de fazer despontar uma semente 
para crescer, pois, toda semente que vinga,
vira planta cuja sina 
é abrir-se em longos braços
nos galhos que hão de cobrir 
quem debaixo dela existir.

Pode-se profetizar pelo sinal,
que há debaixo da sombra do Natal,
o bem guardado em termos de potencial
que se imagina existir detrás das cortinas
da humanidade, apenas esperando a hora
de despontar-se numa aurora na forma verde 
de uma planta que atenda 
pelo nome de esperança.

Profetiza-se o transito no corredor,
onde a força e o poder do Amor
poderá inspirar tudo o que há de bom
no fôlego grande de um acordeom
e uma via luminosa feita só de rosas
que, no seu ofício de ponte, nos conduza 
para onde estiver nossa busca constante por uma
estrela que aponte a verdadeira casa da realeza.

Profetiza-se a substância da novidade
no travo precioso de um vinho,
que lembre o calor de um ninho
como a verdadeira morada da felicidade
a embriagar todo aquele que anda e canta
e que, mesmo na dificuldade, se levanta
e, com um profundo suspiro, organiza-se
na crença de que possa fazer
esse mundo parecer um pedaço de paraíso.



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quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

O artista
















A seu modo, o artista malabarista na corda bamba,
faz da vida seu rumo enquanto anda.
O seu voto é uma espécie
de sacerdócio no palco do mundo.
Às vezes ele vaga anônimo e,
num aparente ócio, enquanto espanta,
taxam-lhe de vagabundo.
Na casa da arte, o seu pseudônimo
é uma identidade e o percurso indefinido
em trilha aleatória, por tantas tentativas distantes,
enche-lhe a vasilha vazia de sopa
com a multidão incontável de instantes e pessoas.

Há quem diga que os grandes artistas
deveriam ser preservados e eternos,
mas, para o bem de todas expectativas,
ao serem efêmeras e rápidas as suas visitas,
fica esse rastro luminoso de cismas
no caminho do êxodo de um povo,
que necessita de luminosidade e fogo
no deserto para alcançar a terra prometida.

A herança de todo Prometeu engorda
o saldo da conta, mesmo quando não se obtém fama
e, de repente, a Arte é um estado de espírito
que, por mais que pareça esquisito, dá-se.




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segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Astrologia














O Natal sideral é sem limite.
É sem fundo e sem alto,
sem frente e sem costas no que existe.
Aqui na Terra, é cheio de brilhos,
cheio de compras, luzes e vidrilhos.
O seu barulho se faz nos hinos,
na ceia, e nos festejos de um zelo
que faz com que ele seja esquecido
no fundo das palhas de um celeiro.
Enfraquecido e imperceptível,
seu palácio considerável
fica escondido junto com as estrelas
e  os corpos celestiais do céu perfeito
que tem por costume, em seus feitos,
escutar os queixumes e desejos dos mortais.

Para o mago que persegue ensejos,
mesmo que o destino não seja claro,
a esperança dos desejos no
cisco debulhado, faz da agulha
no palheiro a grande preciosidade no espaço vago.
O mago aposta na rota imprecisa de um cálculo
que não tenha por base a física ou a astronomia,
mas a jornada íntima e intuitiva que disponibiliza
a confiança no Alto como alvo a ser buscado.
Isso, porque cada ser vivente, na rotina dos espantos,
navega continuamente no que possui de planos.
Entretanto, sem considerar o salto interior em seu mar,
onde a presença da estrela setentrional 
é o contínuo Natal de cada dia, 
mesmo que os desatentos marinheiros,
na nebulosidade natural, 
avistem apenas a corrente imprecisa
da trilha escorregadia que liga janeiro a janeiro.



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domingo, 14 de dezembro de 2014

Petite Bourgeoise

















No dia esvoaçante de um espantalho,
eu quero ser uma lagartixa no mato
para estar encarrapichado
e,  com os olhos esbugalhados,
ficar imune a inseticidas e depósitos bancários,
com os pés fincados em tudo.
No momento crucial do espetáculo
eu ficarei mudo, escolherei a pobreza em espasmos
para ouvir as implicâncias de toda a gente saliente,
que atacará a minha ignorância demente
por eu não valorizar com elas os modelos de aparências.
No lugar de cinema e garotas de Ipanema,
oferecerei minhas costas caracachentas.
Aos que me repreenderem com dureza,
responderei sim com a cabeça,
e todos os que comem bagre africano
e arrotam caviar californiano
defenderão suas ilusões perdidas
como quem  protege o sentido da vida
pois, para eles, não se deve mastigar
folhas de boldo para esgoelar
a gosma amarga dos estorvos,
e a felicidade deve ser doce como
se fosse valsa,  mesmo que seja falsa.

No dia em que se deve andar
de um jeito que impressiona e fazer
coisas que alguém ambiciona,
eu quero a  liberdade de uma ciranda
e, no mato, na forma de uma lagartixa,
subir em círculos nas piritas e fados,
com pouca ilusão de dourados
e imune aos triviais afagos.
Permanecerei distante e invisível,
camuflado na folhagem com olhos de caça
e fugindo decidido da massa
que me quer, com ela, dissolvido
na torcida e aos brados.

E ficarei sozinho do lado da feiurinha
nessa parte do mundo que é de poucos,
nesse corpo de vértebras que é mais solto,
nesse agosto de fumo de rolo
com folhas curtidas e enrodilhadas em repouso.
Minha felicidade será sempre diferente.
Será estar dentro de mim e não com as gentes.
Será cavar um ouro solitário na floresta das palavras
que, para mim, sempre será mais reluzente.

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sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Geração esponânea
















O homem que mata e come,
tem a escrita do seu nome
na tripa de um abdome.
Tem na cápsula de ar comprimido
a salvação do mal adquirido.
Tem na espátula, o movimento da mistura
para cimentar lacunas do intestino,
onde gritam os ácidos pelos
alimentos ingeridos.
No almoço ordinário, possui o almaço vago
onde saltam os nutrientes
numa fila de pára-quedistas indigentes.
Porém, quando a dor avermelha-se,
imagina que o estômago é usina
movida não somente a combustível
de vitaminas, mas, pelos estrondos
de um armazém em incontáveis vinténs.
Ao comer comida, esquece que também comeu
palavras e sonos que latejam insetos aos berros.
Apalpa-se agônico, buscando amparo
na perambeira de um desmaio
porque de tudo encheu sua barriga
e germinou ratos numa algazarra irrompida.




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quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Flor de Lótus















O mundo dos lobisomens
é feito insistentemente do recomeço
porque o fim do mundo mesmo,
não é onde Judas perdeu as botas.
Não está no final de uma rota
nem é o óbito catastrófico
do vestígio de um vento radioativo  
ou terremoto a varrer os portos
com ondas imensas de um milhão de mortos.
O fim do mundo é o insistente tropeço
cada vez que desaparece o homem
e toma o seu lugar o lobo vesgo.

Ao se destampar a boca-de-lobo
para jorrar a água dos esgotos,
há de se ter uma pequena arca projetada
que carregue a humanidade preservada
para conter o impulso de um dilúvio súbito
que arraste a joia suscetível da calma.
No curso das tolerâncias, a flor do lodo
é a esperança apaziguadora dos mino-touros.
É a lúcida mansidão diante de um soco.
É a resposta última à febre insana
de não se lutar em vão diante de uma
atitude tirana que faça declinar,
por um segundo que seja, a casa da nobreza
onde mora o tesouro do coração.





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segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Caleidoscópio














Embora façam-te venenos e flechas,
marreta, garimpando fundo tuas promessas.
Caça no largo das imundícies
porque bem sabes, poeta, a forma de encontrar
o que é raro exige sangue, febre e vertigens.
Exige dedos que formiguem 
as pendengas não resolvidas.
Exige acordes de órgãos 
a sacudir com os ventos os que dormem,
e um ar extraordinário que te seja esquisito,
que ressoe, talvez, a voz de um anjo vadio
a revelar algum segredo proibido.
Escreve com as agulhas as mensagens tuas
e surgirão variadas visões
brotadas em touceiras de capim gordura.
Na densa fumaça, caminha sem receios
e com a certeza de que haverão barulhos
a incomodar-te os devaneios.
Assim, tua palavra ciciada será escassa.
Será uma cisma retirada da vasilha
e debulhada no caleidoscópio de tua diáspora.

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domingo, 7 de dezembro de 2014

Via Lactea














                      Para o poeta André Eugênio,
                      que bateu asas.

Valeu a pena os momentos difíceis.
Fiquemos felizes, pois prêmio das batalhas
dissolveu as léguas da via Apia.
Permanece sozinha, agora, a crisálida
(a borboleta foi visitar a via Láctea).
Permanece fechada a cápsula
no silêncio de casa abandonada.
A antiga forma adquiriu asas
e foi, vestida de borboleta, consultar estrelas.
Foi, colorida, recordar belezas que um dia deixara.
Despertou-se alegre no Sol maduro de seara
e não há mais importância no receptáculo
se adianta-se, nesse momento, um novo espetáculo.
Na casa do verdadeiro coração,
a sua Poesia flui, agora, no rio eterno e límpido.
O coral das águas relança-se em pingos
e aqui, em nossa terra árida,
namora a lavoura dos verbos.
Chegam de lá notícias a toda hora
em forma de canções e palavras assopradas
que escrevem, com asas de borboletas,
o universo pleno onde a voz de uma cigarra
verte palavras entusiasmadas no sereno.







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sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Desenho Mágico













Se ficasse encharcada
com restos reluzentes de silêncio
e,  em seu elevado mosteiro, estagnada,
a paz ficaria entregue à sentença 
de sua comodidade e, 
longe do que lhe é costumeiro,
gozaria de si mesmo acomodada numa
constante estabilidade enclausurada.
Mas não. Muito longe disso tudo,
é na aventura e no risco de ser aniquilada
a qualquer momento que robustece o seu vulto.
É na inspiração de um instante, querendo salvar-se
nas águas revoltas à mercê das forças,
que se faz presente e, apesar do tumulto
e dos insultos, responde continuamente calada.
Quanto mais é provocada e testada, eleva-se.
Na pressa raivosa dos impacientes,
escolhe-se branda e, lenta e serena,
permanece inatingível e quieta.
Espalha-se numa reta, mesmo que desapercebida,
em minúsculas gotas dissolvidas
para insinuar-se num lapso de vida.
Nos casos de contendas, esforça-se
em acalmar a turba escalena
por um segundo que seja.
Deseja no mundo cumprir o destino
de andar por entre os homens em desatino
e difundir a substância vagarosa do firmamento
onde as estrelas e seu alumbramento
unem constelações em desenhos
que revelam um castelo mágico.
É destes altos estágios e não na Terra,
onde atua no exercício diário do limite precário,
que entoa uma canção que, 
de vez em quando, cá embaixo,
fechamos os olhos e a ouvimos.




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terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Prece






















Oh, Mãe Carinhosa, seja tua resposta
na última hora de súplica lacrimosa
o conforto e refúgio no porto
a quem te procura à deriva.
Assopra teus lábios de rosa numa brisa
que alivia, oh Auxiliadora e Magnífica!
Que tua luz bendita faça-se facho,
guiando os nossos passos,
oh Espelho de Justiça!
Vagueia por sobre as nossas casas,
Imaculada, entornando tua graça
e recolhendo angústias em cimitarras!
Leva para o Alto a prece sussurrada em
cada pensamento que pede ou agradece.
Livra-nos do perigo do inimigo conhecido
e desconhecido e faça dos raios de Sol
de tuas vestes, a nossa esperança para
um novo arrebol onde sejam todas
as nossas lutas, o ingresso na vitória futura!

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domingo, 30 de novembro de 2014

Engenho















                                           Para Karla Nascimento

Ao final, a ramagem de cipreste alisou-se fina
em cabelos e acalmou o agreste chão,
polvilhado em desmantelos.
Aquelas viagens longas, tornaram-se mais breves
valorizando, enfim, as lembranças mais leves.

Ao final, arrebentou-se solene aquela semente
que anteriormente era a mais resistente.
Serenou-se o espetáculo notável dos ímpetos
e as astúcias, folgaram-se aliviadas nos vínculos.

Ao final, sob o efeito nutriente de um vendaval,
os passarinhos mais velhos e enfraquecidos,
resolveram visitar um deus marinho, e o sacrifício
encontrou no azul límpido o final de um crucifixo.

Ao final, tornaram-se planas as ladeiras agudas e
serena, a descrença insana recitou uma sutra
porque em paz, os esplendores acordaram-se do sono
mundano para o incandescente brilho e a pele gasta
no engano, valorizou as rugas na estrada de cada ciclo.

Ao final, a nuvem fria transformou-se em alegria,
o engenho do tempo dissolveu as esquinas e,
num antigo madrigal, as antipatias rederam-se mínimas.

Ao final, cada objeto em repouso agradeceu
seu lugar de pouso e rendeu graças ao Vigia,
pois tudo se resolveu misteriosamente
como não se sabia e fossem desnecessárias
aquelas preocupações insistentes do início do dia.




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quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Psicanálise
















Obstruído ego, há silêncio em tudo.
O mundo ficou mudo assim que
consumiste anestésico.
No vale de sombras,
onde não existem  árvores,
apenas o amor é o verdadeiro milagre.

Massageado ego, não te esqueças
que todo sucesso é turvo.
A ilusão elevada ao cubo é distração
que não te deixa mudo
ao fabricares o orgulho e o entulho. 

Acomodado ego, para mais de metro
vai o teu elástico.
Quando não fores mais estático,
enxergarás teus medos,
tuas vulnerabilidades,
e os arremedos de felicidade.

Obstinado ego, esquece um pouco
o teu magistério cego.
Não há lume nesse minério velho.
O que não presumes,
é que a tua insegurança e teu ciúme,
tua inveja e tuas inclinações,
fazem-se de árvores no vale de sombras
no reinado das tuas ilusões.

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domingo, 23 de novembro de 2014

Vitória-Minas














Pelo ferro vai o trilho, o minério,
gameleira, lua cheia, noite alta,
madrugada, vai o dia, vai o rio,
passa-casa, passa-casa, passa-casa.
Passa breve a parada, passa-morro,
passa-lago, passa-carro, passa seco,
passa barro, passarinho, passa ninho,
passa gosto de cocada, passa nuvem,
passa moça, passa sonho, passa fundo,
passa tempo, passa raso, passa caso
por acaso, passa túnel, passa certo,
passa vale, passa mina, passa agosto,
boi rumina, passa lama, passa iodo no salobro.
Passa doido no delírio do seu ouro,
cata o cisco, cata-mica, cata-couro e cata lodo.
Passa ponte num instante, passa-ano,
passa monte, passa fundo, passa raso,
passa feira de mercado, passa manga
na mangueira, passa fruta, goiabeira,
passa cerca fazendeira com cigano acampado.
Passa poste, passa rua, todo dia
passa tudo, correria, bate-perna, bate-perna.
A menina na janela imagina a novela,
passa-casa, passa tempo numa espera,
no vazio de uma tela passa tudo numa reta,
passa curva, passa logo o pavio de uma vela,
passa trilho, vai de lado, vai correndo deslizado,
o navio já espera, já espera, já espera,
numa tela azulada vai embora nesta hora
vai levando, vai levando todo ferro retirado ...



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