sábado, 17 de agosto de 2013

História do Batatinha















No pasto, as louras flores de camomila,
E na terra, os afazeres das formigas,
Dão-se reinados para seus olhos
Que no mundo vagueiam incólumes

Porque o mundo guarda-se imaculado
Nas gavetas de tesouros inviolados
Onde o cego nunca saberá por certo
A real vastidão do seu deserto.

Ao norte, esquivando-se das bússolas,
Passeia ele em formosuras.
Não guarda ofensa miúda
E contenta-se com o perder-se na rua.

Em noite púrpura que a tudo encobre,
Agasalha sapos e gafanhotos nobres
Que haver-se-ão empossados,
Cada qual em seu mandato.

Nem antes e nem depois, mas no ponto,
Na reta onde está o encontro
Para as cortesias e os acidentes,
Vai o doido cismando silente.

Em bandeirolas murmura ao vento
Os recados que são inventos
E ouve o som das assembleias
Lá do alto das camélias.

Nas vértebras de cristais quebrados
Moram épicas do que foi sonhado
E as lutas de tantas tertúlias
Marcaram sua carne em fúria.

No relâmpago viaja e anda
Ou nas estrelas que cintilam.
O chão duro é sua cama
E tem uns olhos que imaginam:

“Uma vez, tive família,
Mas, perdendo minha filha,
Visitei a insanidade
E encontrei felicidade

Neste paraíso achado,
Onde sigo encantado
De imagens e poesia,
Não me importo mais com os dias.”

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domingo, 11 de agosto de 2013

Mística


























Com esforço até o pescoço, posso ver
a casa ampla onde morava a santa.
Por fora é pequena, mas, por dentro, multi-iluminada.

Que me valham as palavras,
pois palavras não valem uma palha
para o amor ardente de santa Tereza D’Ávila.
A realidade, dita concreta, é, no fundo, abstrata
e o símbolo é precário para descrever
o acesso ao que não se mostra finito.
Do universo definido, nada se compara ao absoluto,
ao não figurável, ao arqui-distante e não físico.

E é na voz dos mistérios que me ponho místico,
neste feixe de emanações para um Jardim Absoluto,
pergunto aos mistérios por algum furo.
Não por uma porta secreta e subterrânea,
mas, por uma abertura momentânea
que me permita a chave de um minuto.
O Tempo é claro e escuro.
Suas cortinas densas de realidade aparente
não revelam o ínfimo e o último.
Assim, a ilusão de que tudo é imediato
é o que chamamos de realidade.
A impressão de que tudo é matéria
é o que vemos pela janela.
E o fim das coisas é um fim solitário,
depositado num relicário enquanto memória.
Mas, o caminho das escórias traça o trajeto das esmeraldas.
O movimento do cometa e de sua calda
risca uma jornada no céu.
Assim, arde um fogo abrasador por trás dos véus.
Fogo amoroso e divino de um cenário lindo que há de ser avistado.
Por isso, as palavras precárias tateiam o impossível.
São elas o instrumento reconhecível
de um tesouro não mostrado.



sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Poema da Mordida













Tuas unhas: minhas mágoas fundas
E a onda de sangue que espuma
Bem antes que o dia durma
Indo flanar no espaço.

Sou teu capacho
Neste doer de prazer desbravado
Tendo-nos forrado com o seu lençol de flores

Aonde fores irei também
Lambendo o chão dos armazéns
À custa de algum trocado

Meu pescoço é maçã para tua arcada
E a cada final de semana
Espero pelo meu roxo de hematoma.

Estala o teu chicote
E mais a coceira aumenta
Por um vergão de sorte que não me sustenta.



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