quarta-feira, 4 de junho de 2014

A Obra
















Na altura insalubre,
põe-se risonha a gravidade,
chamando o pedreiro que se equilibra no cinza da manhã.
Ele põe água na mistura e assobia feliz na libra do dia.
A claridade maciça envolve o andaime
e o pedreiro enche de massa o vão do tijolo,
afina com água o reboco
antes que alguém lhe chame.
Dentro de muito pouco
nada mais haverá nesta história,
que existe sozinha no vão
junto aos passarinhos
numa longa distância do chão.
Dentro de muito pouco esta história será o sopro
naquele inacabado reboco.
Dormirá na mesma tumba onde dormem as glórias,
onde descansam os césares,
onde pulsam todas as vitórias e promessas
que um dia fizeram parte de um vento que assopra.
O pedreiro não sabe disso.
Só se interessa pela obra
porque a obra é seu ofício.
Não sabe que o segredo dos reis
e dos vassalos é o mesmo na noite silenciosa.



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2 comentários:

  1. Caro Bispo,
    já li e reli trabalhos sobre tumbas e Dinastias, palácios e imperadores, sem, no entanto, me atentar para o olhar dos construtores, sejam eles pedreiros, servos, escravos ou mesmo os “amigos de Khufu” do Egito Antigo. Ler o passado sob o prisma de um "segredo" q une governantes e governados é encantador e o arremate com a imagem da "noite silenciosa", um deleite!
    Grande abraço,
    Ana

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  2. Agradeço muito e me comovo de ter você como leitora, querida Ana Aquino! Principalmente por sua sensibilidade e densidade! O Egito é outra de nossas afinidades. Sou apaixonado pelo Egito, sua mitologia, história e cultura. Digo-lhe que é muito bom desfrutar da sua companhia! Grande abraço!!!

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