domingo, 24 de novembro de 2013

A criatura

















Resultado do acúmulo de muitas partes,
eu quero este meu traste banhado em bravura
feito a herança da criatura de Frankenstein
que, mesmo costurada em partes,
segue confiante para Jerusalém.

Se há liberdade em seus passos,
os erros, acertos e medos,
serão folhas de uma árvore
cuja escolha caberá ao vento dizê-lo e,
assim, não haverá outra ordem senão crescer.

Desovo, então, algum ferro velho para o sangue,
alguma garrafa velha e vidro colorido para os olhos,
algum bronze esquecido para a pele,
algum mármore quebrado para os ossos.
Desovo tudo isso porque o traste
tem corpo de gólgota e coração de ególatra,
por isso se encolherá diante da degola.
Necessitará de um coração despojado
que não pense em recompensas e que,
na chuva alta e fria da noite,
aguente firme a falta de abrigo.

Necessitará de uma humildade
que não more no inoxidável,
mas na ferrugem e nos germes da sucata:
o passado e o lixo,
onde a vida deflagrada já marcou presença.

Quero que o meu filho compreenda,
em sua existência, que amar não é uma condição.
Amar os semelhantes e compreender
o limite das incompreensões
é um exercício solidário a ser instalado
em algum lugar do coração.

Porque preciso desta bandeira,
tento construir ao vento este filho
com a nobreza dos trastes serenos.
Meu desejo aberto são dedos e
puãs de caranguejo.
Fecho os olhos e garimpo luz
no barro das manhãs.
Minha esperança de crescer clama
e, no limite do escuro,
me aguardam as tais figuras,
cada qual com uma cura em forma
de oferenda para a minha criatura.



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5 comentários:

  1. putz Bispo, nesta semana visitamos o mesmo inferno, por caminhos bem diferentes...

    vê lá
    http://marcospizano.blogspot.com.br/2013/11/o-arremate-do-giz-de-alfaiate.html

    abs mano

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  2. Sim, mano: o segredo das costuras e o produto delas! Que bom que ainda podemos andar, mesmo com os cerzimentos e chuleamentos, não? Abraços. Saudade de você.

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  3. Fui lá. Vou fazer-te mais visitas, doravante. Prometo! Mais abraços.

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  4. amar é um exercício...seu filho há de compreender...tao bonito isso aqui...

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  5. Agradeço, Adriana Riess Karnal. E concordo também. Que bom ter voê aqui. Seja bem vinda! Grande abraço.

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