Para Lina Mendes
Quando toca, o músico evapora-se
aos poucos rumo àquela
viagem que incendeia
toda a teoria vegetal em que as
plantas
já não são verdes e sim feitas de
notas
musicais com a coloração de bolhas
de sabão.
Quando toca, o músico leva a si
e aos outros a uma tonalidade furta-cor
em que o céu tinge-se de uma
substância fulva
de manga madura e a música
magistral recolhe
cada bolha sonora do instrumento
e as espalha
formando uma nova província.
Enquanto toca, o músico olha para
dentro de si e deixa-se perder
no lombo dos trechos melódicos
que vão troteando aos poucos e,
depois,
adquirem asas e se elevam,
deixando para trás o universo
depauperado das carências.
Os gestos e as expressões ecoam a
a paisagem acantilada dos
penhascos enérgicos e um lago
sutil.
Cada trecho singelo resgata todos
os que costumavam ficar em
vigília
extremosa e, nela, nada ouviam ou
enxergavam.
Os acordes amolecem agora os
ombros macilentos
e, lentamente, envolvem o
embarcadiço
numa fita de seda esvoaçante.
O sabor das notas é o mesmo de
uva
madura dependurada nos colchetes
que se dispõem na armação de uma
pauta.
Cada stacato sacode a parreira
e retira uma sonoridade madura da
videira.
A melodia torna-se camélia
pousada na alma porque
dissolve as varandas de ferro e
as amarras postiças e ríspidas.
Com a música, o espírito levantou-se
do leito sórdido e instalou-se
numa expedição
a lugares batidos de sol
que antes, pouco brilhavam
na frincha escavada e oferecida
aos olhos maravilhados.
As cordas inúteis que pendiam
a escada aparatosa libertam
o mundo dos acordes e, com eles,
aparece a paisagem de diferente
fisionomia.
No lajeado dos pedregulhos,
forra-se o veludo mudo das pausas
enevoadas e, no chão,
cintilam as pedras preciosas.
O céu poente, revolto e rubro, descortina-se
ao epílogo o crepúsculo na
quietação
de um subúrbio e a música vai
diminuindo.
Cantarola a pacata vida de um rio
em seu murmúrio e some no vento
de um suspiro marinho.
Termina, então, a fuga ligeira de
quem,
enfastiado, visitara um lugar
que sempre estivera tão longe
e tão perto de um mundo
recém-descoberto.
Caiu, por tempo ignorado, a
parede severa
de passagem estreita, de teias de
aranha
tecidas em ruínas abandonadas.
Rompeu-se a gravidade dormente
em nome de uma estrada apalaçada
enfeitada em rosas e grinaldas, e
que ficava embaixo do entulho de
mármore
e dos batimentos da alma.
Evaporou-se, enfim, o ar velho
das antigas
monarquias em nome do extraordinário.
.
Una belleza alada y de aire. Y de música, como Lina.
ResponderExcluirAbrazo a los dos.